Recentemente comecei uma maratona de filmes do Universo Cinematográfico da Marvel (o MCU) com minha filha. Vamos fazer na ordem em que os filmes foram lançados, portanto, o primeiro foi Homem de Ferro (que pra minha surpresa, ela curtiu bastante). O segundo, foi O Incrível Hulk. Como eu acho que nunca o tinha revisto por inteiro desde que o vi no cinema, acabei reparando o quão ele é esquecido pela Marvel e esquecível pelos espectadores.
Tem muita coisa envolvida nesse filme, então não dá pra falar dele sem mencionar e até explicar tudo que o cerca. O principal, é talvez a mais óbvia: o recast, a troca de ator que interpreta o personagem.
Eu gosto muito do Hulk que ficou ‘mais famoso’ no UCM, o do Mark Ruffalo. Acho o ator muito talentoso, dá uma boa nuance para o Bruce Banner e seu Hulk é, no mínimo, competente. Mas o Bruce de Edward Norton é ótimo também, além de ele ser a cara do personagem nos quadrinhos.

Agora, depois de tantos anos, vejo que se tivesse continuado com ele poderia ter rendido um Bruce com jeitão mais bocó mesmo, lerdão. O Ruffalo até consegue colocar um tom próximo disso, mas pra mim, parece mais com algo inocente e sensível, do que um inepto social.
E por que ele saiu? Segundo o próprio Norton, ele não quis se comprometer com um só personagem e com uma série tão grande de filmes por tantos anos. Ele queria aproveitar mais as oportunidades que viriam a aparecer pra ele como ator para mostrar seu talento, interpretando personagens diferentes. Como ele mesmo citou, caso tivesse continuado, teria perdido a oportunidade de fazer filmes como Grande Hotel Budapeste ou Birdman (ambos aclamados).
Faz sentido? Sim, bastante. Mas até certo ponto, já que ele deveria saber que seria assim quando foi procurado para fazer o personagem. Talvez ele não tenha acreditado que um filme de super-heróis teria uma continuidade tão longa, afinal, o que a Marvel estava fazendo era novidade. Não se sabia onde aquilo tudo iria chegar de fato, era uma aposta ainda. Mas de toda forma, já tínhamos atores que fizeram o mesmo personagem super-herói por muitos anos, como Christopher Reeve em Superman. Pra mim, isso é um migué.
O que consta é que ele assinou para ser o protagonista do filme e também roteirista, mas não foi creditado por essa função. Além disso, por ter tido pouco tempo para entregar o roteiro, acabou fazendo ajustes durante a produção do filme. Norton, aparentemente, também teria direito a opinar sobre o corte final do longa, mas ele e Louis Leterrier (diretor do longa) tiveram problemas com os produtores por conta disso. E ainda há os boatos de que ele é um ator muito ‘difícil’, o chamado ‘estrelinha’.
De toda forma, essa treta não contribuiu em nada para a sedimentação do personagem no MCU, mesmo sendo um super-herói muito mais famoso e querido do que o Homem de Ferro, por exemplo.
Outro ponto, é que os direitos do personagem não estavam totalmente com a Marvel Studios. Se você não sabe, lá nos anos 90 a Marvel Comics estava muito mal financeiramente e fatiou os direitos de seus personagens para produções audiovisuais, vendendo para diversos estúdios. A Fox pegou basicamente todos os mutantes e o Quarteto Fantástico, a Sony tudo que se refere ao Homem-Aranha e a Universal ficou com o Hulk e seus ‘agregados’.
Havia aqueles personagens que eram mais complexos e estavam num tipo de limbo, pois se relacionavam muito com outros personagens que estavam com detentores diferentes, como o Rei do Crime, Namor e os gêmeos Mercúrio e Feiticeira Escarlate. Mas isso é outro assunto.
Quem quiser entender melhor, tem um guia visual abaixo que ajuda, lembrando que na ocasião em que foi elaborado, Demolidor (Fox), Blade (New Line/Warner), Motoqueiro Fantasma e Justiceiro (Sony) já haviam retornado para a Marvel/Disney e/ou Netflix, que também tinham um acordo.

Voltando ao Hulk, e conectando tudo que vimos até aqui nesse texto, o que concluímos é que todos esses fatores acabaram contribuindo para que esse filme, que não é lá excelente, mas está longe de ruim por completo, ficasse completamente esquecido num cantinho escuro do MCU.
E isso porque nem vou entrar no mérito de que já havíamos tido um filme do solo do Hulk (pré-MCU) que foi um fracasso de crítica e de público. Dele, só se aproveitou a ideia da origem, que é apenas recapitulado nos créditos iniciais desse que estamos tratando aqui…
A única coisa que acabou sendo reaproveitada posteriormente na ‘história maior’ do MCU, foi o General Ross (William Hurt), que voltou à cena em Capitão América: Guerra Civil e teve pequena participação em Guerra Infinita e Ultimato dos Vingadores. O personagem também participará do próximo filme do MCU, Viúva Negra.

Fora isso, Betty Ross (Liv Tyler), o grande interesse romântico de Bruce (com quem ele se casa nas HQs) e que é filha do próprio Gen. Ross, foi sumariamente ignorada dali pra frente. Sequer é citada novamente, pelo que me lembre. Até chegou a haver uma insinuação de que aconteceria algo entre Natasha (Viúva Negra) e Bruce (Hulk).
Mas até mais importante que a Betty, tem os outros personagens. Leonard Samson (interpretado pelo excelente Ty Burrell) é quase um figurante na história, quando nos quadrinhos é parte importante do lore do Hulk; o Abominável (vilão do filme interpretado por Tim Roth) foi capturado depois de uma luta um tanto mixuruca e nunca mais citado; e Samuel Sterns (Tim Blake Nelson), que no filme aparece como Mr. Blue, em sua última cena aparece sendo contaminado pelo sangue de Bruce Banner e começa a ter uma mutação em sua cabeça. Nos quadrinhos, ele se torna o Líder, um dos principais vilões do Hulk.
Kevin Feige, chefão da Marvel Studios, uma vez disse que ainda não havia descartado totalmente o Líder, deixando a entender que procurava a melhor forma de aproveitá-lo. E o General Ross, parece estar sendo construído de uma forma que ainda terá uma importância maior nesse universo, possivelmente se tornando o Hulk Vermelho (e quem sabe dando início aos Thunderbolts, equipe de vilões usados pelo governo, estilo Esquadrão Suicida).
Assim sendo, o quanto, de fato, O Incrível Hulk de 2008 impactou no MCU que conhecemos hoje? É difícil colocar em números, mas dá pra dizer que quase nada. Praticamente não deixou nenhum legado. É quase como se fosse possível pular esse filme quando se pensa numa maratona como a que estou fazendo. Eu poderia simplesmente explicar em uns 5 minutos quem é o Hulk e o que ele estava fazendo na Índia quando a Natasha o encontra em Vingadores.
Mas há esperança de vermos mais do Hulk nos cinemas, com a dignidade que o personagem merece. Há rumores de que a Marvel recuperou por completo os direitos sobre o personagem, que ainda estavam parcialmente com a Universal, travando um filme solo do personagem.
Pode ser que tenhamos o tão esperado filme solo dele, ou que haja uma passagem de bastão na série da She-Hulk que chegará em breve pelo streaming Disney+. Afinal, o Gigante Esmeralda é hoje um dos únicos Vingadores originais, ao lado do Thor e do Gavião Arqueiro e está em uma fase complicada, já que está com o braço bugado por conta dos eventos de Ultimato e não se destransforma mais, tendo virado uma mescla de Bruce e Hulk. Ou seja, está totalmente descaracterizado.
Eu acredito que essa passagem de bastão vai acontecer em breve para os três Vingadores remanescentes, e talvez eles façam apenas cameos no MCU futuramente, ou nem isso… O Gavião já meio que se aposentou duas vezes e tem treinado a filha, mas também pode passar para Kate Bishop, como nos quadrinhos (rumores dão conta de que já há até uma atriz escalada para personagem). Já haverá uma Thor, a Jane Foster. Nada mais justo que esse Hulk atual deixar sua prima, Jennifer Walters, como membro dos Vingadores em seu lugar, afinal, ela participa muito mais da equipe nos quadrinhos do que o próprio Hulk.
Qualquer que seja o destino do personagem, é uma pena que ele tenha sido tão mal aproveitado, ou que pelo menos não tanto quanto poderia. E esse filme, que na época me lembro de ter gostado muito, tenha sido tão negligenciado e esquecido. Havia muito potencial.