Uma série derivada de um filme da DC que eu não vi ninguém pedindo. Nem o filme, tampouco a série. O filme foi surpreendentemente bom, não incrível, mas bem divertido. E a série… Bem, essa foi incrível. Pacificador é uma série que ninguém queria antes e agora todo mundo que viu quer mais.
50% do mérito da série ser muito boa é de James Gunn. Sim, o cara responsável pelos Guardiões da Galáxia na Marvel e pela ressurreição do Esquadrão Suicida na DC é o produtor e diretor dessa série. E, possivelmente, esse seja seu trabalho grande onde sua assinatura esteja mais marcante. Afinal, é a primeira vez que o vemos desenvolvendo uma história em mais do que apenas umas 2h.
Pelo menos uns outros 35% de responsabilidade pelo sucesso da série e de John Cena, que faz o protagonista. O cara está absolutamente à vontade no personagem e a gente vê a alegria dele em fazer aquilo, como ele está se divertindo. Ele chegou a ir caracterizado como Pacificador em um programa de talk show.

Ele até me lembra o Ryan Reynolds como Deadpool, que hoje em dia é praticamente impossível dizer quando estamos vendo o ator e quando é o personagem. Eu imagino que em pouco tempo teremos a mesma sensação com Cena e o Pacificador.
E digo mais: pra mim, se continuar nesse ritmo, ele pode até chegar no mesmo patamar de The Rock / Dwayne Johnson como ex-wrestler e ator consagrado. O cara é puro carisma e mostra que consegue fazer muito mais que dar porrada e reproduzir expressões faciais e corporais duvidosas. Ele realmente tem recurso, só falta mais experiência e conseguirá atingir essas nuances com convicção. Tente lembrar de uma cena em que The Rock teve que chorar e que realmente te emocionou. Ou que ele genuinamente riu e te fez rir junto, daquelas gargalhadas. Difícil né? John Cena conseguiu ambos (mais de uma vez) em 8 episódios.
Isso sem falar que John mostra na série que dança bem (questionável, ok) e ainda toca piano! Sim, ele realmente toca e manda muito bem!
Os outros 15% de mérito pelo sucesso da série se dividem entre os outros atores e roteiristas que fizeram um ótimo trabalho também entregando uma série muito divertida e diferente de qualquer outra da DC até então e até mesmo da Marvel, mesmo essa parecendo ter vários padrões diferentes de séries. Ah, também é justo dar crédito à Warner por apostar no Gunn e no Cena e dar essa liberdade criativa um tanto rara por lá.

Voltando à assinatura de James Gunn, se você curte as músicas nostálgicas (e até mesmo improváveis) que ele consegue encaixar nas suas produções, especialmente nos dois filmes dos Guardiões da Galáxia, você vai adorar a trilha sonora de Pacificador. E se você, como eu, ama a farofada do Glam / Hard Rock, aí você vai ao delírio. Que trilha sonora, senhoras e senhores! Todo episódio há pelo menos um momento musical memorável, alguns deles em cenas de ação frenéticas que ora são impulsionadas pela música, ora tem o tom totalmente alterados por ela. Imagina cabeças (literalmente) explodindo e tripas voando ao som de uma balada melódica ou com letras duvidosas como a de Reckless Love -Monster. Segue o refrão:
Monster
She’s my favorite
Monster
She’s my beautiful
Monster
She’s a monster, yeah
Come on in my bed
Come on pretty monster gimme
Come on pretty monster gimme
E isso porque nem vou comentar sobre a bizarra/genial abertura que tanto tem repercutido na internet. A propósito, se você também curtiu muito a trilha sonora da série, como eu, e quer ouvir essas músicas em loop, aqui vai a playlist do Spotify:
Se você não faz ideia do que se trata essa série, ela é um tipo de spin off do bom filme O Esquadrão Suicida, que foi tipo um soft reboot misturado com continuação do primeiro filme da equipe, que havia sido um fracasso de crítica.
Aqui vai um pequeno spoiler sobre o filme, caso você não o tenha assistido. Durante os acontecimentos do filme, há um momento onde o Pacificador se revela tipo um traidor da equipe e para cumprir sua missão, supostamente morre. Porém, na cena pós-créditos, vemos que ele sobreviveu e que agora poderá fazer parte de uma equipe ‘ainda mais secreta’ que o Esquadrão. E na série vemos o desenrolar dessa equipe e sua missão.
Naquele momento, muito gente (eu incluso) pensou: ‘Beleza, mas pra quê uma série desse personagem?! Tanta gente e história mais interessante pra contar…’ Só que nós esquecemos que estamos falando de James Gunn, o cara que pega equipes e personagens que ninguém se importa, ou sequer conhece, e transforma em algo incrivelmente divertido e até mesmo relevante. Olha, eu arrisco dizer que ele tá ajudando muito a pavimentar uma reerguida para o DCEU.

A série não apenas entrega 8 episódios muito bem desenvolvidos e interessantes, como também personagens bem escritos e interpretados em uma história que se mostra coerente dentro daquele universo onde está inserida. Tanto, que no último episódio há cameos surpreendentes (pelo menos pra mim) e muito bem contextualizados.
Não vou falar muito do plot, até pra não estragar a experiência de quem não assistiu ainda, pois ir descobrindo tudo junto com os personagens e entender o que acontece é boa parte da graça da série. Mas adianto que há problematização de questões muito revelantes e inteligentemente encaixadas na história, de modo que até os nerdolas que reclamam de lacração vão engolir, pois junto de coisas séries temos tripas e ação desenfreada e piadas de 5ª série. E olha: funciona tudo maravilhosamente bem!
Aí que James Gunn se supera. Ele consegue unir a galhofa, o não se levar a sério mesmo falando de coisa séria, com sangue jorrando, alienígenas e ação desenfreada ao som de muito rock n’ roll. Ele parece um pós-adolescente do final dos anos 80 e início dos 90 que se recusa a crescer mas é extremamente talentoso. E se ele errou naquela história dos tweets com piadas inadequadas de 15 anos atrás, ele tá fazendo um excelente trabalho se redimindo através da sua obra.
Ah, um comentário bônus: me lembrei muito dos trabalhos do Tarantino em diversos aspectos, é muito provável que ele seja uma influência para o Gunn. Pra mim, um traço bem marcante e que só quem conhece bem a assinatura do Quentin vai notar, são os diálogos aleatórios que (aparentemente, e às vezes, realmente) não levam a lugar nenhum, mas dão bastante liga e até amenizam a tensão entre uma cena e outra. Há um momento no último episódio onde dois personagens conversam sobre a importância das formigas no ciclo da vida (?!) e se há mais delas do que há peixes (?!?!).
Pacificador é bem o que aconteceu com Guardiões da Galáxia e O Esquadrão Suicida: ninguém pediu, ninguém se importava ou botava fé antes, poucos (ninguém?) conheciam mesmo o personagens, talvez eles nem mesmo tinham tanto desenvolvimento e profundidade nos quadrinhos até então, mas agora não dá mais pra viver sem. E queremos mais. E vamos ter: a segunda temporada já tá confirmada!
Recomendo Pacificador, mas não para qualquer um que curta filmes/séries de super-heróis. É preciso um pouquinho mais de estômago do que estamos acostumados. Mas ao mesmo tempo, dá pra recomendar pra quem não curte esse gênero mas ama uma babaquice descompromissada, humor e ação fáceis, tiro, porrada, bomba, sangue e aliens. Nem precisa dizer que o público alvo é (no mínimo) +16, dependendo da sua sensibilidade, até +18.